quarta-feira, 3 de maio de 2017

Fórum de Debates: O QUE É O AUTISMO, HOJE?


Aconteceu em Belo Horizonte, no dia 26 de abril de 2017, o Fórum de Debates – O que é o Autismo, hoje? – promovido pelo Observatório da EBP-FAPOL, em parceria com a Universidade FUMEC, onde Sérgio Laia conduz uma pesquisa sobre o autismo. O Fórum contou com a participação das colegas do Observatório vindas dos quatro cantos do Brasil, além daquelas que vivem em Belo Horizonte. Amplamente divulgado na Rede Pública de Saúde Mental, Instituições que trabalham com crianças e adolescentes e Universidades, o Fórum contou com mais de 400 inscritos, entre estudantes universitários, profissionais de Saúde Mental – psicólogos, psiquiatras, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, assistentes sociais, Residentes em psiquiatria – educadores, familiares e sujeitos portadores do diagnóstico de autismo, alguns dos quais puderam também se manifestar.

O evento teve início pela manhã, com a projeção do filme-documentário “O cérebro de Hugo”, que a despeito de suas hipóteses psicológicas e biológicas, traz o testemunho vivo de vários pacientes autistas, que com humor e uma pitada de ironia, nos falam de seu sofrimento no contato com os chamados “normotípicos”. O debate, realizado pela professora Astréia Soares, que ressaltou a plataforma política constituída atualmente pelo autismo, e por Júlia Oliveira Rodrigues, do grupo de pesquisa de Sérgio Laia, foi coordenado por Cristina Vidigal, e provocou ressonâncias no restante do evento.

Na abertura da tarde, o Diretor de Ensino da Faculdade de Ciências Humanas da FUMEC, João Batista de Mendonça Filho, nos deu as boas vindas, e Elisa Alvarenga, coordenadora do Observatório, anunciou nosso programa de trabalho e as razões que nos reuniram para esse Fórum, calcadas na vocação da psicanálise, enquanto prática discursiva, de promover laços. O autismo, para além de uma categoria nosológica que temos a tarefa de interrogar, é uma modalidade de gozo prevalente na clínica contemporânea que faz enigma e interroga as classificações, assim como a própria existência da psicanálise.

Após a abertura tivemos a surpresa de escutar, ao piano, uma composição de um jovem, que em seguida tocou duas canções acompanhado pela voz de uma jovem. Ambos escreveram, juntos, sua apresentação, lida por Sérgio Laia, onde falam de suas dificuldades para estarem com o Outro, e a maneira como intervenções sensíveis e simples lhes têm permitido fazê-lo. Foi um momento tocante que nos apresentou, em ato, o que é o sofrimento desses sujeitos e suas maneiras de trata-lo.

A primeira mesa abordou uma apresentação de pacientes realizada com um sujeito autista do Courtil, na Bélgica, por Alexandre Stevens, no filme “A céu aberto”. Bartyra Ribeiro de Castro pôde comentar os efeitos que esta apresentação e este filme tiveram para este jovem, testemunhadas pelo próprio Stevens no livro Affinity Therapy.

A segunda mesa contou com um caso clínico apresentado por Rachel Botrel, a partir do qual Cristina Drummond pôde destacar a operação de separação entre o corpo e a voz que o tratamento tem possibilitado, permitindo o surgimento de uma enunciação própria. O relato do trabalho de Suzana Barroso na Clínica-Escola da PUC-Minas com sujeitos autistas nos apontou como, ao limitar o imperativo de múltiplas terapêuticas, pode-se constituir um circuito que faça função de borda e de circuito pulsional. No lugar de incluir o autista no Outro escolar, constrangindo suas invenções, não seria o caso de propor a inclusão do Outro escolar nas iniciativas do autista? - pergunta Suzana. Anamaria Vasconcelos testemunhou o quanto o desenho tem, para Diogo Calife, que ilustra o cartaz do Fórum, uma função no seu tratamento.

A terceira mesa contou com o testemunho de três mães, que nos falaram de suas batalhas para dar um lugar ao filho no mundo. A experiência, particular a cada uma, do encontro com a singularidade do filho e o impacto do diagnóstico, assim como as escolhas e decisões que tiveram que fazer, foi-nos contada, por cada uma, com seu toque pessoal de poesia, em sintonia com aquilo que a psicanálise ensina: não se trata de adaptar o paciente ao seu meio, mas de tratar o meio para que o paciente possa alojar aí suas invenções, abrindo portas e construindo ferramentas. Em cada caso trata-se de fazer o luto de um ideal, como destacou Heloisa Telles.

A quarta mesa, sobre a inclusão dos autistas, trouxe a experiência, apresentada por Fernanda Ramos, de inclusão de um jovem autista em uma escola pública de Belo Horizonte. Se a função do monitor ou mediador escolar se aproxima daquela do duplo, como fazer para que ela não seja intrusiva? Paula Borsoi falou sobre sua experiência, como assessora da Coordenação de Saúde Mental, de inclusão desses pacientes na Rede Pública do Rio de Janeiro. A Reforma psiquiátrica levou muitos anos para chegar às crianças e a clínica feita por vários tem mostrado que a inclusão está no cotidiano e no nosso olhar e diz respeito ao Outro. A Empresa Dia a Dia finalmente apresentou sua proposta de estabelecer um currículo específico a cada sujeito, evidenciando que a inclusão implica o desejo, como destacou Ana Martha Maia.

Finalmente, na última mesa, mais conceitual, Paula Pimenta nos apresentou a evolução do autismo dentro da psiquiatria e suas classificações, apontando como o conceito de espectro autista tenta dizer algo sobre uma menor ou maior abertura ao Outro. Sérgio Laia apresentou-nos então alguns resultados parciais de sua pesquisa, em curso. Ele propõe pensarmos o autismo como uma “marca humana”, com tudo o que essa marca carrega da idéia de nódoa ou mancha, que faz alusão à dimensão estranha do gozo para um ser falante. Explicita-se assim a diferença entre o autismo e as psicoses e a dificuldade de, no autismo, fazer aparecer o furo ali onde prevalece o excesso, metaforizado, nas leituras biologicistas, pelo excesso de conexões neuronais. Apesar do adiantado da hora, pudemos ainda discutir a oportunidade que a clínica do autismo nos oferece para pensarmos clinica, epistêmica e politicamente a presença da psicanálise na atualidade, para além dos protocolos e classificações, mas também para além da clínica estrutural.

Para concluir, gostaria de destacar as ressonâncias que 12 horas de Fórum provocaram, além da satisfação pelo que aprendemos. Pais de autistas, presentes, vieram dizer do seu desejo de participar, de uma próxima vez, com seus testemunhos. Educadores vieram dizer o quanto os debates foram esclarecedores, e pedir interlocução. A Coordenação de Saúde Mental testemunha o quanto foi rico, e quer participar e orientar seu trabalho. Colegas de várias cidades do Brasil endereçam seu trabalho, ligado ao autismo, ao Observatório. Durante o Congresso da EBP, que começou no dia seguinte, Ana Lydia Santiago, coordenadora do Observatório da Criança e do Adolescente (OCA), ligado à UFMG, convidou o Observatório da FAPOL, que prontamente aceitou, a ser uma célula ligada ao OCA, aceitando, reciprocamente, que o OCA seja uma célula ligada ao Observatório da FAPOL. Atuando em campos diferentes, porém com objetivos comuns, apostamos que o nosso trabalho só tem a enriquecer com esse espaço de intersecção, celebrado com Flory Kruger, Presidente da FAPOL então presente.



Elisa Alvarenga
01.05.2017

Texto de Henrique Heffner e Beatriz Pessoa


Afirmamos que “você não precisa seguir o padrão de normalidade que o mundo te exige”.

Eu sou Beatriz estudante de Serviço social e tenho algo a dizer sobre a inclusão:

“No mundo existem várias pessoas, algumas delas tem mais dificuldades que as outras. Por isso devemos acolhê-las e ajudá-las a encontrar um lugar no mundo em que todos nós vivemos.

Não é tão difícil. No meu caso por exemplo, uma coisa simples fez muita diferença.

Na hora da prova eu sentia uma emoção que me deixava muito exaltada. O que comprometia meus resultados. Fazer uma prova separada da turma, com uma pessoa ao meu lado, me possibilitou um pouco mais de maturidade para enfrentar as minhas dificuldades”.

E Henrique, pianista e compositor, nos esclarece:

“Quando a questão é mais complexa, como em casos de depressão temos uma outra experiência que pode ajudar as pessoas, inclusive os autistas.

Não se deve deixar a pessoa sofrer o quanto quiser. Você tem que dar espaço para ela, para que ela "viva" aquela fase triste. Se você vê que as coisas estão piorando, convide ela para ir a um psiquiatra/psicólogo. Não force ela a nada, pois assim, as coisas vão piorar novamente. Tem que parecer mais que um convite. Mas sem forçar a pessoa, pois isto pode acabar piorando as coisas. Depois disso, o profissional vai usar da melhor forma possível, sendo com orientação de coisas a se fazer, ou até mesmo receitar algum tipo de medicamento.

Mas uma coisa eu falo, se aquela pessoa tem um hobbie, alguma coisa que ela sente prazer, e muito em fazer, não para. Não deixe que a depressão tire as coisas que te dão mais prazer, como no meu caso, foi a sinuca e o piano.

Você pode ser "anormal" e ao mesmo tempo agradar ou tocar os outros. É importante não desistir.”


1- Henrique começa a tocar a música de sua composição.

2- Trem Bala

3- Ana Julia