segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Carta aberta ao educador prudente


Por Iván Ruiz.                                                                   
3 de Outubro, 2015

Irá te surpreender que me dirija a você com o qualitativo prudente. Ao educador prudente. É isso, a prudência, o que se espera realmente de sua função? Não é o educador aquele que se antecipa com seu desejo à aparição de um sinal de interesse? Sim, se conveio chamar a isso ato educativo. Mas, se se trata de um ato, de uma decisão tomada desde a antecipação, onde fica a prudência?

Você pontua com acerto que no título que escolhemos para o próximo Fórum sobre o autismo há um abuso dos termos empregados. Pensamos bem antes de denominar o autista insubmisso? Tinha razão, lançar uma pergunta é também, de algum modo, afirmar o que se questiona. Então, se chamamos o autista de insubmisso, vai nos pedir uma justificativa precisa.

Adverte que a educação não está brigada com o autismo, mas tampouco desconhece que não é tarefa fácil fazer seu trabalho sem a cumplicidade de que deve aceitá-lo. Da mesma forma, o senso comum não serve se se trata de avaliar o grau de satisfação de seu educando. Quem cala, outorga converte-se para o chamado autista numa traição da língua a seu não silencioso.  
       
Você nos esclarece que no seu cotidiano o autista de manual não existe. Que cada pessoa com autismo é claramente diferente de qualquer outra. Para que, então, os protocolos para todos os autistas? Permitirá que não me refira aqui às verdadeiras razões, pois são de outra ordem. Mas, de fato, é por isso que nós falaremos de autismo, mais que de autistas.

E acrescenta, aproveitando a ocasião, que o fórum chama ao debate. Com certeza, a urgência na qual se encontra nos leva a promover um debate com o fim de fazer aparecer o mal-estar dos educadores, dos docentes, dos acompanhantes, dos familiares que, prudentes, conhecem os limites de sua ação. O discurso educativo não precisa de reflexão para seguir funcionando. Mas, se não se conhecem os limites de sua ação, tampouco os efeitos que produza vão ser localizáveis.

Ser prudente não significa não fazer nada. A educação deve tornar-se permeável a cada sujeito, você nos diz. De fato, mas o que fazer no campo do autismo, quando é o sujeito quem não é permeável a essa educação? Desta maneira, a reeducação, como suspeita, não é a resposta desesperada ao fracasso do educativo? Deveremos assim estar atentos ao que nos revela sua prudência. E nos somaremos, então, ao elogio de Baltasar Gracián: “Oh, grande mestre aquele que começava a ensinar desensinando! Sua primeira lição era de ignorar, que não importa menos que o saber.”

Ah! Como bom observador, não deixou escapar que me faltou falar sobre a insubmissão! Se, afinal, o chamado autista é um insubmisso da educação, como fazer para não idealizar esta posição? Por outro lado, alguns autistas obtiveram um reconhecimento social que tornou desejável sua solução para outros. Por que ser diagnosticado de Transtorno de Espectro Autista se poderia se obter a catalogação de De alto rendimento?

Você deve ter tido notícia do mundo de imagens e palavras que Owen Suskind criou com os filmes da Disney. A isto, o chamamos, os psicanalistas, a solução encontrada por um sujeito para sustentar-se no mundo. Entretanto, isso não é exportável, por exemplo, para aqueles que veem uma e outra vez fragmentos escolhidos dessa mesma fabrica. Converter a solução de Owen num método é um erro, do mesmo modo que descartar outras soluções não tão exitosas é uma nova forma de segregação no interior mesmo das instituições. 

Mas, de acordo, tomamos suas precisões com bastante consideração: É o rechaço, no autismo, uma posição sem nuances nem fissuras? O chamado autista rechaça tudo ou podemos, como diz, considerar algo do que ele faz como se de um convite a estar com ele se tratasse? E, finalmente, a insubmissão não implica de fato a existência de um outro frente ao qual não ser submisso?
Vamos trabalhar suas perguntas. Faremos isso no dia 11 de dezembro em Barcelona, no Fórum que estamos organizando no Auditório Axa, e também, desde já, no Caderno do Fórum, que lançamos hoje.

Permita-me agregar algo: Talvez tenhamos que concordar que o isolamento dos demais, que se supunha no autismo, não é senão uma rejeição à submissão ao outro com a que o sujeito interpreta tudo o que é educativo. É claro, deveríamos ter chamado esse fórum de Convenção, pois é o que esperamos obter dos que, como você, estejam presentes nesse dia: Alguns dos princípios que deveriam reger o convite de levar o autismo ao educável. Sua prudência, educador, já é um destes princípios. 

Iván Ruiz
Co-director del Foro sobre autismo 2015
Escuela Lacaniana de Psicoanálisis




Tradução: Anna Carolina Nogueira

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